«Fronteira
De um lado terra, doutro lado terra;
De um lado gente, doutro lado gente;
Lados e filhos desta mesma serra,
O mesmo céu os olha e os consente.
O mesmo beijo aqui, o mesmo beijo além;
Uivos iguais de cão ou de alcateia.
E a mesma lua lírica que vem
Corar meadas de uma velha teia.
Mas uma força que não tem razão,
Que nãao tem olhos, que não tem sentido,
Passa e reparte o coração
Do mais pequeno tojo adormecido.»
Miguel Torga. Libertação (1944)
«Olhamos a face dos perecidos homens que nos deixaram o anseio de todas as viagens, nos territórios agora abandonados. Subimos aos cumes e contemplamos a terra, a superfície visível do sonho de todas as viagens nunca feitas. Quando nos começamos a libertar do medo e não tememos o abismo, a morte fica para trás, damos o passo em frente no vazio inaugural de um espaço/tempo diferente. A nossa alma derrama-se por todos os lugares e o nosso corpo já é só esquecimento. Sonhamos a possibilidade de não haver regresso. E não há regresso. Ao voltarmos todas as paisagens são diferentes. São os passos contínuos em redor do mundo, como que passos na cercania das próprias viagens.»
Duarte Belo. O Vento Sobre a Terra (apontamentos de viagens). Ed. Assírio e Alvim
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